terça-feira, 10 de novembro de 2015

Lei Maria da Penha



Lei Maria da Penha

 Relação de amor e ódio, maridos violentos e mulheres submissas

A VIOLÊNCIA e a MULHER na história:
A violência contra a mulher é produto de uma construção histórica e social. Ao longo dos tempos, as mulheres sempre foram inferiorizadas perante o homem. Desde os primórdios, a cultura humana caracteriza o sexo feminino como o sexo frágil, colocando a figura da mulher como um ser dependente da figura masculina.
A submissão da mulher perante o homem é fato ocorrido desde os chamados “tempos das cavernas” com a famosa figura do homem puxando a mulher pelos cabelos. Na Grécia antiga, a diferenciação entre os gêneros era clara. Em Roma, a mulher não era considerada cidadã e consequentemente não podia exercer nenhum cargo público.
A cultura da religião judaico-cristã só firmou ainda mais a inferioridade da mulher na sociedade. O Cristianismo colocou a mulher como sendo a culpada pelo pecado original, pela expulsão dos homens do paraíso, devendo por isso serem obedientes passíveis e submissas aos homens, que eram tidos como seres iluminados e os únicos capazes de dominar os instintos das mulheres. Com o aumento dos adeptos dessa religião ao redor do mundo, esse pensamento da submissão da mulher foi sendo acolhido pela grande maioria, introduzindo na mulher a consciência da culpa perante o pecado, e dando ao homem o poder de domínio perante ela.
Com o decorrer dos anos, mesmo com as revoluções ocorridas nos países europeus, a mulher continuou sendo privada de seus direitos naturais, tendo apenas as funções domésticas designadas. Foi somente no século XIX, com a consolidação do sistema capitalista que algumas mudanças aconteceram.
No contexto brasileiro, a partir do ano de 1970, grupos de movimentos feministas foram nascendo no país, com o grande objetivo de eliminar as discriminações sociais, econômicas, políticas e culturais de que a mulher é vítima. A luta desses grupos contra o machismo tinha como revolta a impunidade de muitos assassinatos de mulheres sob o argumento de legítima defesa da honra. Pinafi expõe o exemplo do assassinato de Ângela Maria Fernandes Diniz pelo seu ex-marido, Raul Fernando do Amaral Street que não se conformou com o rompimento da relação e acabou por descarregar um revólver contra o rosto de Ângela. Sendo levado a julgamento foi absolvido com o argumento de haver matado em “legítima defesa da honra”. A grande repercussão dada à morte de Ângela Diniz na mídia, acarretou numa movimentação de mulheres em torno do lema: “quem ama não mata”.
Com a pressão dos movimentos feministas contra a violência doméstica, foi criado, no estado do Rio de Janeiro em 1981, o SOS Mulher, um espaço de atendimento às mulheres vítimas de violência, além de ser um espaço de reflexão e mudanças das condições de vida destas mulheres, tendo esta iniciativa se expandido para outras capitais como São Paulo e Porto Alegre.
Depois de iniciada a parceria dos grupos feministas com os estados brasileiros, o acordo para a criação da primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) veio em consequência, contribuindo para dar maior visibilidade à problemática da violência contra a mulher, especialmente a doméstica. A medida adotada pelo Brasil foi pioneira e teve países da América Latina como seguidores, adotando também a criação de DDMs.
Em junho de 1994, a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), aprovou a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, mais conhecida como Convenção de Belém do Pará, tendo o Brasil como signatário e tendo ajudado com a iniciativa da criação da Lei Maria da Penha.



Maria da Penha, quem é?
Maria da Penha formou-se em Farmácia e Bioquímica em 1966, na primeira turma da Universidade Federal do Ceará. Na época em que cursava pós-graduação na Universidade de São Paulo (USP) conheceu o homem que, tempos depois, se tornaria seu marido  e pai de suas três filhas. Ao conhecê-lo, Maria da Penha nunca poderia imaginar no que ele se transformaria.
“Uma mulher quando escolhe um homem, ela quer que seja para sempre”, declarou em um dos seus vários depoimentos.  Simpático e solícito no início do casamento, Marco Viveros começou a mudar depois do nascimento da segunda filha que, segundo relatos de Maria da Penha, coincidiu com o término do processo de naturalização (Viveros era colombiano) e o seu êxito profissional.
Foi a partir daí que as agressões se iniciaram e culminaram com um tiro em uma noite de maio de 1983. A versão dada pelo então marido é que assaltantes teriam sido os autores do disparo.  Depois de quatro meses passados em hospitais e diversas cirurgias, Maria da Penha voltou para casa e sofreu mais uma tentativa de homicídio: o marido tentou eletrocutá-la durante o banho. Neste período, as investigações apontaram que Marco Viveros foi de fato autor do tiro que a deixou em uma cadeira de rodas.
Sob a proteção de uma ordem judicial, Maria da Penha conseguiu sair de casa, sem que isso significasse abandono do lar ou perda da guarda de suas filhas. E, apesar das limitações físicas, iniciou a sua batalha pela condenação do agressor.
  



O que mudou com a Lei Maria da Penha?
Antes da Lei Maria da Penha, a violência doméstica contra a mulher nunca teve uma lei especifica que a regulasse. Mulheres agredidas se viam encurraladas pela falta de apoio jurídico enquanto que o homem continuava com as agressões já que a sua chance de ser punido era praticamente nula.
A Lei Maria da Penha trouxe dispositivos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Uma das maiores novidades trazidas pela Lei foi a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, os JVDFMs, com competência cível e criminal, o que deu mais celeridade aos processos que continham direito de família incluso, por exemplo.
Outra importante mudança foi quanto à desistência da vítima em prestar denúncia contra o seu agressor. Antes de 2006, a mulher podia desistir da denúncia na própria delegacia, e depois de 2006, ela só fica permitida a desistir da denúncia perante o juiz. Fica à decisão do juiz fixar um limite mínimo de distância entre o agressor e a vítima, seus familiares e testemunhas, e pode também proibir qualquer tipo de contato com a agredida, seus familiares e testemunhas.
E o último dispositivo da Lei, e um dos mais importantes, é o que permite o Juiz determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação, o que faz o agressor ser reeducado psicologicamente para não voltar a agredir a mulher.


A lei:
a definição do que é violência doméstica, incluindo não apenas as agressões físicas e sexuais, como também as psicológicas, morais e patrimoniais;

  • reforça que todas as mulheres, independentemente de sua orientação sexual são protegidas pela lei, o que significa que mulheres também podem ser enquadradas e punidas  como agressoras;

  • não há mais a opção de os agressores pagarem a pena somente com cestas básicas ou multas. A pena é de três meses a três anos de prisão e pode ser aumentada em 1/3 se a violência for cometida contra mulheres com deficiência;

  • ao contrário do que acontecia antigamente, não é mais a mulher quem entrega a intimação judicial ao agressor;

  • a vítima é informada sobre todo o processo que envolve o agressor, especialmente sobre sua prisão e soltura;

  • a mulher deve estar acompanhada por advogado e tem direito a defensor público;

  • podem ser concedidas medidas de proteção como a suspensão do porte de armas do agressor, o afastamento do lar e uma distância mínima em relação à vítima e aos filhos;

  • permite prisão em flagrante;

  • no inquérito policial constam os depoimentos da vítima, do agressor, de testemunhas, além das provas da agressão;

  • a prisão preventiva pode ser decretada se houver riscos de a mulher ser novamente agredida e

  • o agressor é obrigado a comparecer a programas de recuperação e reeducação.


O resultado da Lei

A Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres realizou um estudo, entre outubro de 2006 e maio de 2007, para mensurar os impactos da Lei Maria da Penha na vida das brasileiras. Neste período:

  • abriram-se 32.630 inquéritos em delegacias do país com depoimentos das vítimas, dos agressores e de testemunhas;

  • 10.450 processos criminais foram encaminhados nos Juizados e Varas adaptadas;

  •  5.247 medidas de proteção às vítimas foram autorizadas;

  •  realizaram-se 846 prisões m flagrante e 77 em caráter preventivo e

  •  foram feitos 73 mil atendimentos pelo Ligue 180, sendo que 11,1 mil se tratavam de pedidos de informações sobre a lei Maria da Penha;

De meados de 2006 a setembro de 2007, foram criados 15 Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e 32 Varas foram adaptadas. A própria secretaria reconhece que o volume ainda é bem inferior ao necessário para combater o problema e que a dificuldade advém de uma mudança de cultura do próprio Judiciário.
Ainda é difícil prever os resultados concretos da lei em relação à quantidade de casos de violência praticados contra a mulher. Se cai o número de denúncias, não é possível determinar se isso se deve a uma intimidação maior das mulheres por conta do novo instrumento legal, ou se, de fato, a lei inibe a ação dos agressores. Por outro lado, um aumento de denúncias pode revelar tanto que as mulheres estão mais corajosas para lutar por seus direitos quanto que o número de agressões, de fato, aumentou.
De todo modo, a lei Maria da Penha cumpre a indiscutível função de colocar o assunto em evidência e chamar a atenção da sociedade para este antigo drama contemporâneo.
DENUNCIE: Disque 180

Pesquisa: Breno Souto

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